06/10/2013

José Terra - A vida e a obra poética

José Terra
Abril de 2007, no Monumento ao 25 de Abril,

em Fontenay-sous-Bois (região parisiense)
por Dominique Stoenesco

José Terra [pseudónimo de José Fernandes da Silva] nasceu em Prozelo, Arcos de Valdevez, a 24.05.1928.

Poeta, filólogo, historiador, ensaísta, crítico, tradutor e professor catedrático.
         
Tendo frequentado o seminário até aos dezassete anos, fixa-se em Lisboa como empregado comercial (1946) e frequenta estudos universitários. É licenciado e mestre em Filologia Clássica pela Universidade de Lisboa. Doutorou-se na Sorbonne – Universidade de Paris III, em 1984, com a tese intitulada «João Rodrigues de Sá de Meneses e o Humanismo Português».

Lecionou no ensino secundário, em Lisboa, e a partir de 1957, ano em que é nomeado pelo Instituto de Alta Cultura como Leitor de Português numa universidade em França, não mais deixará de ensinar e promover a língua e a cultura portuguesas nesse país: em Aix-en-Provence, Nice, Paris. Desde 1988 que é professor catedrático na Universidade de Paris IV – Sorbonne, agora jubilado.



Cofundador e coeditor – com António Luís Moita, António Ramos Rosa, Luís Amaro e Raul de Carvalho – da revista Árvore – folhas de poesia, de que saíram quatro fascículos: de 1951 a 1953 [1.º fasc., Outono de 51; 2.º fasc., Inverno de 51-52; 3.º fasc., Primavera e Verão de 52; Vol. II, primeiro fasc., Outono de 53. No último fasc., Egito Gonçalves substitui António Luís Moita] e, na sua sequência, cofundador da revista Cassiopeia – Antologia de poesia e ensaio, igualmente publicada em fascículos e de que saiu um número único, em março de 1955, sob orientação de António Carlos, António Ramos Rosa, João Rui de Sousa, José Bento e José Terra.

Colaborou como poeta e como ensaísta – neste domínio tem-se dedicado sobretudo à literatura e à história do Renascimento – em diversas publicações periódicas: Árvore, Cassiopeia, Seara Nova, Vértice, Nova Renascença, Colóquio/Letras, JL – Jornal de Letras, Artes e Ideias, Diário de Notícias, O Comércio do Porto, Boletim Internacional de Bibliografia Luso-Brasileira, etc.


Distinguiu-se na escrita literária com a publicação de quatro livros de poesia: Canto da ave prisioneira (1949), Para o poema da criação (1953), Canto submerso (1956) e Espelho do invisível (1959). Volumes agora reunidos em edição integral na sua OBRA POÉTICA (Porto: Modo de ler, 2014 – no prelo), acrescida de textos dispersos e inéditos, tornando a sua poesia visível para o leitor atual, libertando o canto da ave poética para que espelhe a sua arte no panorama literário português.

O seus poemas foram incluídos em diversas antologias poéticas coletivas e pelo seu volume Canto submerso (1956) foi galardoado com o Prémio de Poesia «Teixeira de Pascoaes», um ano antes.
         

Como tradutor, verteu para a língua portuguesa, especialmente com a chancela Livros do Brasil, obras de David Garnett (A mulher-raposa, 1955); Giovanni Papini (Vigia do mundo, 1955); François Mauriac (Os anjos negros, 1956); Vasco Pratolini (O bairro, 1956; As raparigas de Sanfrediano, 1956); Albert Camus (A queda, 1957, com muitos “reprints” até à atualidade); André Maurois (A vida de Victor Hugo, 1958); Paul Arrighi (História da literatura italiana, 1959); Pierre Teilhard de Chardin (O fenómeno humano, 1965 – trad. com Léon Bourdon); Elio Vittorini (Consideram-se mortos e morrem, Lisboa: Portugália, 195?); Georges Le Gentil (Camões, 1969 – trad. e notas); Colette Callier-Boisvert (Soajo: entre migrações e memória: estudos sobre uma sociedade agro-pastoril de identidade renovada, 2004 – trad., texto rev. e aumentado). Traduziu para francês uma antologia da poética de Ruy Belo – Une façon de dire adieu (1995).

José Carlos Canoa

Principal fonte bibliográfica:
Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, Vol. V,
Lisboa, 1998 – versão online na DGLB.



OBRA POÉTICA + um conto:




Canto da Ave Prisioneira

Lisboa: Edição do autor, 1949.

 – capa com um desenho de José Viana Dionísio
[o futuro actor José Viana).



Para o Poema da Criação
Lisboa: Edições Árvore, 1953.

– Com dois desenhos de Cipriano Dourado 
e o texto poético «A visão paradisíaca» de António Ramos Rosa.







Canto Submerso.
Lisboa: Portugália Editora, 1956. 

– Com capa de Fernando do pintor Fernando Azevedo
– Prémio de poesia «Teixeira de Pascoaes»,
recebido no “ano anterior”.






Espelho do Invisível
Lisboa: Livraria Morais Editora, 1959.
 – Col. “Círculo de Poesia”.






«Vou até ao fim do mundo», conto de 1951

in Contos do Minho: colectânea de contistas minhotos.
Póvoa de Lanhoso: Ave Rara, 2002, pp. 161-174.

Receção a Obra Poética (Modo de ler, 2014)

  • GUIMARÃES, Fernando, «Reler José Terra», Relâmpago, n.º 34, abril 2014, pp. 208-210.

Alguns estudos sobre José Terra


S.a. – "MARIA DE Lourdes Belchior, José Terra e Pedro Tamen", Colóquio/Letras. Letras em Trânsito, n.º 140/141, abr. 1996, p. 349.

AA.VV, Árvore et la poésie portugaise des années cinquante (1951 -1953), actes du colloque organisé par Maria Helena Araújo Carreira, Paris:  Éditions Lusophone, 2003.

ANTUNES, Manuel, «?», in Brotéria, Lisboa, vol. 56, 1953, pp. 491-494; reprod. in Padre Manuel Antunes, SJ, Obra Completa: Estética e Crítica Literária, t. V, vol. I, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2009, pp. 25-26, 28.

ANTUNES, Manuel, «?», in Brotéria, Lisboa, vol. 62, 1956, pp. 587-596; reprod. in Padre Manuel Antunes, SJ, Obra Completa: Estética e Crítica Literária, t. V, vol. I, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2009, p. 201.

BRASIL, Jaime [?] – «Livros e Publicações – Canto da Ave Prisioneira – por José Terra – Com capa desenhada por Viana Dionísio» [Edição do Autor, 1949], in O Primeiro de Janeiro, 18.04.1949, p. 6.

COELHO, Eduardo Prado, «A arte e o invisível na poesia de José Terra», in A Palavra sobre a Palavra. Porto: Portucalense Editora, 1972, pp. 205-214.

COCHOFEL, João José, «Crónica de poesia», in Gazeta Musical e de Todas as Artes, Lisboa, n.º 87, jun. 1959, pp. 107-108; reprod. in Críticas e Crónicas, pref. Rui Feijó, Lisboa, IN-CM, 1982, p. 183.

DIAS, Akima, «Uma leitura do conto “Vou até ao fim do mundo”» [inclui uma “apresentação do autor”], in ROCHA, Paula et al, Contos do Minho… à nossa maneira [baseado no livro Contos do Minho]. Braga: CEFP [Centro de Emprego e Formação Profissional], 2012, pp. 97-103.

DIONÍSIO, Mário, recensão crítica de: Canto da Ave Prisioneira (1949), Vértice – Revista de Cultura e arte, Lisboa, vol. VIII, 11.07.1949, p. 57.

ESTEVES, José Manuel da Costa, «La poésie de José Terra: l’acte créateur comme acte libérateur» [comunicação], in Árvore et la poésie portugaise des années cinquante (1951 -1953), actes du colloque organisé par Maria Helena Araújo Carreira, Paris: Éditions Lusophone, 2003.

GONDA, Gumercinda Nascimento, Árvore e o Sentido da Modernidade (As Mil Maneiras de Ver), Tese de Doutorado em Letras Vernáculas. Faculdade de Letras da UFRJ, 2006.

GONDA, Cinda, «“Árvore”: breve história de uma revista», Labirintos: Revista eletrônica do Núcleo de Estudos Portugueses, n.º 4, 2.º semestre de 2008, Feira de Santana: Univ. Estadual de Feira de Santana; reprod. em Teia Literária: revista de estudos culturais: Brasil – Portugal - África [online], n.º 3 – Memória, imaginário e identidade cultural, São Paulo: In House, 2009 pp. 53-70.

GUISADO, Alfredo – «Livros de Versos. Cântico da Ave Prisioneira [jan. 1949], de José Terra», in “Literatura” [página dir. por Alfredo Guisado] do República, 18.03.1949, p. 3.

HÖRSTER, Maria António Henriques Jorge Ferreira, ref.as à obra de José Terra [interpreta o conjunto da obra do Poeta sob a influência de Rilke], Para uma História da Recepção de Rainer Maria Rilke em Portugal (1920-1960). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, pp. 645-652.

LOPES, Óscar, «A crítica do livro», O Comércio do Porto, Porto, 24.11.1959, p. 6.

MARTINHO, Fernando J. B., «Fidelidade ao humano» [cap. dedicado aos poetas da Árvore, apresentando uma visão global e interpretativo da poesia de José Terra], in Tendências Dominantes da Poesia Portuguesa da Década de 50. Lisboa: Edições Colibri, 1996;  2.ª ed., 2013. – A propósito dos poetas da Árvore, ver p. 206-271 da 1.ª ed. e 220-290 da 2.ª ed..

ROSA, António Ramos, «José Terra, “A visão paradisíaca”» - prefácio ao livro Para o Poema da Criação, Lisboa, Edições Árvore, 1953.

ROSA, António Ramos - «?», Seara Nova, Lisboa, n° 1370, dez. 1959, pp. 392-393.

ROSA, António Ramos, Recensão crítica de: “Espelho do Invisível” (José Terra)”, Ler - Jornal de Letras, Artes e Ciências, dez. 1959, p. 392.

ROSA, António Ramos -«?», Cadernos do Meio Dia, Faro, n° 5, fev. 1960, pp. XIII-XIV.

SENA, Jorge de, nota biobibliográfica, in Líricas Portuguesas – 3.º Série, 2.ª ed. em 2 vols., Lisboa, Ed. 70, 1983 [A 1.ª ed., Lisboa, Portugália, é de 1958], p. 355.

STOENESCO, Dominique, «Os poetas portugueses imigrantes, refugiados ou exilados na França (desde os anos 1960-70)» [com nota biográfica sobre José Terra], Légua & Meia: Revista de literatura e diversidade cultural. Feira de Santana: UEFS, v. 4, n.º 3, 2005, pp. 106-130. – disponível online; reprod., em língua francesa, in Latitudes. Cahiers Lusophones, Paris, n.º 27, septembre 2006, pp. 34-45 – sob o título “Les poètes portugais exilés ou immigrés en France, des années 1960-70 à nos jours” [com ilustrações].


ZIMMERMANN, Marie-Claire, «Do obscuro à escrita: um soneto de José Terra», in Terra de Val de Vez, revista cultural do GEPA (Grupo de Estudos do Património Arcuense), Arcos de Valdevez, n.º 18, 2007, p. 131-132.




A beleza espantosa dos poemas:

ESTE POEMA RESPIRA


Este poema respira. Em seus flancos
circula o sangue por artérias novas.
Rasgo-lhe a boca e beijo-o. Dou-lhe os olhos
selvagens e esta inocência que é

a sua vida eterna. Entre os salgueiros
esconde o corpo e o sexo recentes.
Há um cheiro a resina, um cheiro vivo
a sémen, sangue, suor, a flor carnívora.

Este poema é macho. Olhai seus músculos
retesos, suas ancas, seus artelhos,
seu sexo erecto, seu púbis, seus mamilos.

A primeira seta do sol fere-lhe os olhos.
Vede-o agora de rosto entre as mãos limpando
a sujidade materna com o seu pranto.

José Terra

Canto submerso, 1956


Edição utilizada: 
Líricas Portuguesas, 3.ª Série, org. Jorge de Sena, Vol. II, 2.ªed., Lisboa: Ed. 70, 1983, pp. 359-360.



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