18/02/2023

O poeta Rui Rocha e a tautologia essencial do ser
















Rui Rocha
Professor, escritor, poeta.



Rui Manuel de Sousa Rocha, descendente de famílias macaenses, nasceu em Lisboa em 1948 e mudou-se para Macau em 1983, onde reside até hoje.

É formado nas áreas da Sociologia, Antropologia e Educação Intercultural.

Veio para Macau, em 1983, para participar na criação do Serviço de Administração e Função Pública. Pertenceu ao Grupo de Ligação Conjunto Sino-Português (1990 a 1994), na área da Localização dos Quadros e na Promoção do Putonghua [mandarim]. Foi diretor do Gabinete do Ensino Superior (1994-1998), da Fundação Oriente (2000-2009), do IPOR (2009-2012,) e, finalmente, diretor do Departamento de Língua Portuguesa e Cultura dos Países de Língua Portuguesa, o qual criou, na Universidade da Cidade de Macau (2012-2017). Atualmente, Rui Rocha é presidente do Centro de Estudos e Inovação sobre Economia Azul na Região da Grande Baía.

Para além de dirigente das referidas instituições públicas e privadas de Macau e docente no ensino superior, Rui Rocha tem obra publicada em vários áreas do saber, incluindo história e cultura da Ásia, com incidência nas culturas chinesa e japonesa. Nesse sentido, tem colaborado assiduamente na Revista Macau do Governo da RAEM e em língua portuguesa. Redigiu vários verbetes, entre eles "o Chá", para o DITEMADicionário temático de Macau / Thematic Dictionary of Macau (Univ. de Macau, 2010).







Por influência familiar, conviveu de perto com a cultura e a poesia chinesa e japonesa, e em 2012 tornou comum a sua própria poesia reunida no título A Oriente do Silêncio: poemas (Lisboa: Esfera do Caos), a que se seguiu em 2016, Taotologias (Fafe: Labirinto).













pensei nas palavras
como poderia pensar
num ato, num cheiro,
qualquer pequeno prodígio
que abrisse aquela porta
inexplicável e indesejavelmente
fechada da poesia

A oriente do silêncio, 2012





todo o lugar é um lugar vazio
nem as árvores nem as pessoas
farão menos vazios esses lugares

o olhar de hoje será diferente
do olhar de amanhã
como dos dias que se seguem

contudo tudo continuará vazio
tão vazio como a morte de um deus
que nunca existiu  
Taotologias, 2016





um velho ramo de árvore
balança na brisa do rio
a tarde esconde o canto das aves
Taotologias, 2016





nada digas do verão azedo
gravado no coração da laranja
as sobras da casca servem para doce

Taotologias, 2016





entre a espada e a cruz navegantes
há um vermelho mar salgado
que mastiga as torturadas palavras
sangrando ainda nas costas do império
as sombras negras, índias ou mestiças

Taotologias, 2016



 

no salgado aroma da tarde
saúdo os teus olhos
ante a solidão do mar
a tela branca dos teus dedos
enlaça as polifónicas palavras
na memória lenta do crepúsculo
Taotologias, 2016




Leituras:


Em Rui Rocha, neste seu livro de poemas encontro ambas as tradições, da meditação chinesa, ou dos Haikai do Japão. Ele escolhe Bashô, como mentor, eu lia Issa e outros. Meditava sobre a beleza dos caracteres, em livros de arte, em que também o poeta Henri Michaux se inspirou, em muitas das suas obras. O fascínio era o da imagem, pictórica, e da ideia ou conceito que em si mesma encerrava. O grande prazer (e a grande lição) que se retira da espiritualidade chinesa, neste caso, é o da relação com um cosmos que nos inclui, a partir de uma entrega feita de simplicidade e despojamento, perante os factos da vida: pessoal, social ou até mesmo política. Em todos eles a relação com o cosmos está presente. E o mistério, que é o caminho do TAO, reside apenas e só nesse entendimento, interior, profundo. 
[...] Dado o tom, podemos continuar a leitura, que já sabemos terá de ser feita de meditação, e não apenas de folhear rápido das páginas. Retomam-se imagens como a da lua, e a noite irá encher-se de presenças, de ausências, de perfumes de criaturas amadas.
Yvette Centeno, in Literatura e Arte



“A poesia de Rui Rocha sugere, tal como acontece com a fluidez e plasticidade da caligrafia chinesa, a visibilidade dos sentidos do que se contempla mas não pode ser inteiramente expresso. 
É um relato sensível do aqui e agora do lugar. 
É essencialmente o estar que transcende a dimensão do texto, reservando um espaço para o silêncio entre as palavras, o tecido intersticial que afinal confere sentido ao próprio texto. 
Desta obra emerge uma poética do branco, a cor do enigma, e da luminosidade personificada pela lua cheia tão ao gosto dos poetas da China e do Japão.”





Para saber +


[audio, 17:18], in Português, 11.12.2019.
Acerca das suas raízes familiares, vinda para Macau, etc. - Excelente!


in blogue Literatura e Arte, 27.11.2016.
*
MATEUS, Victor Oliveira - O Oriente e o Silêncio na Poesia de Rui Rocha, 
in Revista de Cultura/Review of Culture, International Edition, Macau, n.º 44 , III série, 4.º Trimestre (2013), p. 58-63. 
*
in RCI, n.º 61 (2019), 137-145.
*
FARIA, Alexandre Graça & Beatriiz Pérez - Estratégias literárias em Rui Rocha,
In Zi Yue, ano 2, vol. 2, n.º 1 (2022), p. 7-21





詩歌






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